Vários sujeitos individuais ou coletivos já tentaram decretar o fim dos processos do Fórum Social Mundial. Sempre me pergunto, por quê. A única certeza que tenho é que, quem alardeia seu fim não tem participado de nenhum de seus momentos recentes. Fala à distância. O motivo, talvez seja porque os processos do FSM não tenham donos, nem se moldado aquele ou àquela dinâmica de um ou de outro movimento social. Sua riqueza é justamente esta, por ser de tod@s, não é de ninguém. Certo é que o processo do FSM, nascido do espírito de Porto Alegre em 2001, para surpresa de todos e todas, continua vivo e presente nas agendas, mentes e corações.
É evidente, se faz necessário melhorar, sempre. Por isso, a importância da oportunidade de um evento temático, em janeiro de 2016, em Porto Alegre, como atividade preparatória à edição mundial no Canadá. O objetivo é fazer um balanço organizado e sistematizado, dos primeiros quinze anos do processo do FSM, seus avanços, dilemas e desafios.
O mundo pós 2001 mudou radicalmente. No entanto, os dilemas da humanidade continuam maiores e cada vez há menos tempo para se reverter a crise civilizatória que o sistema capitalista impõe a todos nós. O imperialismo está ruindo e aponta para a possibilidade de uma nova grande guerra mundial, sem precedentes, visando redesenhar, mais uma vez, o mapa mundial a seu bel prazer e interesse.
Os partidos e governos de esquerda foram, na sua maioria, cooptados pela agenda capitalista, tendo como objetivo principal, manter o equilíbrio do atual sistema às custas dos direitos sociais e de degradação ambiental. Não há um horizonte utópico visível e a desesperança é o maior perigo que se vislumbra no horizonte.
Por outro lado, a revolução tecnológica dos meios informação, sua instantaneidade, o acesso quase que universal às redes de comunicação, a decadência moral dos meios de comunicação de mercado e a massa juvenil mobilizada pelas redes sociais é uma novidade no cenário político e cultural de muitos países. Uma oportunidade nova que tem se demonstrado útil para desestabilizar antigos castelos físicos e políticos. Mas, por outro lado, insuficiente para construir novos acordos de gestão e governança coletiva e participativa.
O FSM nasceu, não por vontade de uma ou algumas organizações, mas como uma necessidade vital das lutas sociais em todo o mundo. Teve como mote a crítica ao pensamento único centrado no mercado e também a crítica a ideia de partido único como estratégia exclusiva de combate ao capitalismo. Desde seus primeiros passos se propôs a sair apenas da denuncia e apresentar propostas concretas e viáveis para um outro mundo possível.
Nestes quinze anos, iluminou mentes e corações de milhões de pessoas e ajudou a orientar propostas de dezenas de governos populares em todo o mundo. Manteve sua metodologia radicalmente horizontal, plural e autogestionária. Mas pode mais. Por isso, refletir sobre os porquês dos erros e acertos é fundamental para que haja aprendizado coletivo. Neste sentido, a metodologia do Fórum Social Porto Alegre 15 Anos propõe que hajam discussões e produções prévias para alimentar o debate e facilitar este processo de múltiplas sínteses coletivas. Cada rede, organização e movimento social que tem participado do processo do FSM está convidad@ a se mobilizar para que esta reflexão seja ampla e coletiva. A intenção é clara, construir novos consensos para fortalecer este nosso processo coletivo mundial.
Certo é que a possibilidade de superação da crise civilizatória somente será viável a partir de uma grande coalizão internacional das organizações e movimentos sociais e populares do mundo entorno de algumas agendas e propostas. Nada que se assemelhe a uma estratégia centralizada, com comando e direção, pelo contrário, uma agenda com orientações, linhas e diretrizes gerais capazes de orientar cada segmento, cada experiência de como agir em seu logos em prol dos valores universais.
Mantendo-se o princípio da autonomia dos processos do FSM em relação aos governos e aos partidos políticos, creio que também se faz necessário que haja um espaço ou canal de diálogo com os partidos e governos de esquerda, para que nossos acúmulos, opiniões e até cultura política possam perpassar as lógicas dominantes das experiências de governos e de organização política partidária dominante na esquerda mundial e para que, também nós, possamos discutir os limites objetivos e os processos de transição necessários para a construção do outro mundo possível.
Como sempre, tudo é processo. Há momentos de acúmulos, articulação e de fortalecimentos. E, outros, de desorientação, frustração e desânimo. Quem enxerga o processo, não fica deslumbrado com os momentos positivos e nem desesperançado com as crises. O momento é de reacender a esperança de um outro mundo possível e saber que, juntos, temos capacidade de construí-lo. Porto Alegre poderá ser, novamente, o palco de mais um momento de convivência, diálogo e celebração da vida. Venham com alegria e fé no coração.
Por: Mauri Cruz é advogado socioambiental, especialista em direitos humanos, professor de pós-graduação em direito à cidade e mobilidade urbana, diretor regional da AbongRS.