Ditadura nunca mais

Mauri Cruz (*)

Desde que algumas instituições públicas brasileiras tomaram medidas à margem do estado democrático de direito como a condenação de pessoas sem provas, a suspensão da posse de ministros sem que houvesse qualquer fato legal que o impedisse, a destituição de eleitos sem o devido enquadramento legal e a prisão de pessoas sem que fossem cumpridas todas as salvaguardas constitucionais, era previsível que o Brasil estava abrindo uma porta para um período antidemocrático. Estes atos já eram antidemocráticos.

Só a democracia é garantia da liberdade. Em qualquer outro regime, quem decide o que é ilícito ou não é o grupo que detém o poder e se sente autorizado, por mandato divino ou por de seus próprios pares, a impor suas normas como sendo as únicas válidas, possíveis e autorizadas. A escravidão era legal no Brasil até 1888, as mulheres eram propriedade de seus pais ou de seus maridos no Brasil até 1891, o assassinato de judeus era legal na Alemanha Nazista até 1945. A luta das defensoras e defensores dos direitos humanos sempre foi uma luta contra estas e outras leis desumanas, injustas e, do ponto de vista dos valores da humanidade, anti éticas.

O discurso do candidato do PSL neste domingo à tarde (21/10/2018) não deixa dúvidas de que ele sonha, deseja e, se eleito, irá implementar no Brasil um regime a sua imagem e semelhança. Tudo o que destoa de sua opinião, de suas crenças, de suas ideias, será considerado por ele e por quem o segue, como sendo ilegal, criminoso, indesejável e que, segundo as suas palavras, deverá ser submetido a sua ordem ou sofrerá as penas da violência do estado que estará sob seu controle.

Parte de seus apoiadores sabem e esperam que ele não esteja brincando com estas palavras. Que não seja uma retórica eleitoral. O candidato já demonstrou neste período que não respeita a opinião alheia. Se nega a enfrentar o debate público de suas ideias. Não se dispõe a colocar suas verdades em discussão, frente ao contraditório, para que possam ser confrontadas ou comprovadas com fatos e argumentos. Infelizmente, uma enorme parcela do povo brasileiro está sendo iludido pela ideia simplista de que é preciso um presidente forte, que tenha capacidade de enfrentar o crime organizado, que tenha capacidade de fazer o que precisa ser feito. Estão caindo na velha luta contra o comunismo, batida e rebatida tantas vezes. Para isso estão elegendo uma farsa, alguém que há 28 anos é deputado, que faz da política uma profissão para si e para sua família e que está, igualmente a outros político, envolvido em crimes de corrupção.

Tenho tentado incansavelmente dialogar com quem está iludido com essas campanha falsa e infame. Aqueles que só sabem dizer que o PT implantou a maior corrupção de todos os tempos e que mandou bilhões de reais para outros países eu pergunto: Seriam os Governo do PT mágicos para terem realizados dezenas de excelentes programas sociais como Bolsa Família, Minha Casa Minha Vida, Prouni, apoio a Agricultura Familiar, aumento real do salario dos servidores públicos e, ao mesmo tempo, terem realizado a maior corrupção da história do Brasil e ainda terem repassado bilhões de reais aos países ditos “comunistas”. Onde estava todo esse dinheiro na era do Collor/Itamar e do FHC? Onde está todo este dinheiro agora, já que o PT está fora do Governo Federal desde 2016? Engraçado, eles mudaram o discurso. Agora não falam mais no tríplex do Guarujá, ou do kit gay. Estão vociferando com a ameaça comunista. As mentiras propagandas com vultuosos recursos empresariais pelas redes sociais não deixam qualquer dúvida a quem este possível governo irá servir. As elites empresariais que querem o fim dos direitos para aumentarem seus lucros.

Aos indeciso apelo para que não se iludam. Não há uma ameaça comunista. Não houve recursos do povo brasileiro doado a nenhum governo estrangeiro. Não há risco algum de perda de liberdades com a candidatura do Professor Fernando Haddad e sua vice Manuela D’Ávila. Essa ideia de que há uma estratégia comunista para tirar o Brasil dos brasileiros seria cômica não fosse trágica porque está alimentando um ódio irracional entre brasileiros e brasileiras que lutam, cada uma a sua maneira, por um país melhor.

Sou da geração de aprendeu a lutar contra a ditadura. Eram tempos diferentes. Não se dizia o que pensava para qualquer pessoa. Na família temas políticos eram discutidos com reserva porque sempre havia dúvidas sobre o grau de vinculo com o regime militar de alguns parente. Na escola e no trabalho, a organização era feita de forma clandestina. Um professor ou um chefe de sessão poderia ser um infiltrado do regime militar que usava esta estratégia para ter controle sobre a organização da sociedade civil. O medo de ser delatado por algum desafeto era real.

Mas vencemos a ditadura. Aos poucos, o conjunto da sociedade se deu conta que a liberdade é melhor do que qualquer avanço econômico. Que não vale a pena sacrificar o direito de ter opinião, de divergir, de votar, de decidir por causa de alguns trocados a mais no final do mês. Desde 1985 ampliamos nossos direitos, de forma democrática, passo a passo, ouvindo e respeitando opiniões diferentes. Em tempo algum desrespeitamos quem optasse por votar em qualquer candidato de direita ou centro direita. Por que, apesar de suas ideologias, havia um pacto pela democracia, apesar de seus limites.

Mas quis a vida que novamente fossemos chamados a luta pela democracia. Por isso, nesta semana derradeira, não há outra coisa a dizer que não seja, Ditadura Nunca Mais. Nenhum passo atrás. Nenhum direito a menos. Não iremos esmorecer por causa de mentidas e infâmias falsas que escondem interesses escusos. Iremos vencer. Neste dia 28 elegendo Haddad Presidente o único que se compromete a manter o direito ao contraditório, que defende o respeito aos diferentes, inclusive o direito de opinião da turma do ódio e da violência. Mas se não for domingo, será nos próximos meses, ou no próximo ano, ou nos anos seguintes. Não iremos descansar até que o sol da liberdade volte a raiar em nossa pátria mãe gentil. Já fizemos isso uma vez. E éramos um grupo muito menor de pessoas, éramos menos preparados, tínhamos uma visão simplista da gestão pública e da própria política. Mas vencemos. E nada nos impedirá de vencermos novamente.

(*)Advogado socioambiental, professor de pós graduação em direito a cidade, mobilidade urbana e gestão de organizações sociais. Membro da Diretoria Executiva da Abong e do Conselho Internacional do FSM.

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