Uma declaração dada em aula por um professor de Direito da PUCRS vem causando polêmica desde a manhã de quarta-feira (22), quando a frase foi imediatamente compartilhada por um estudante no Facebook. “As leis, como as mulheres, foram feitas para serem violadas”, teria dito o professor de Direito Empresarial III Fábio Melo de Azambuja, segundo estudantes. A observação, feita em tom de piada de acordo com testemunhas, foi considerada apologia ao estupro. Os alunos entraram em contato com a universidade para manifestar indignação com o ocorrido.
O aluno Luan Sanchotene, que divulgou primeiramente o ocorrido no Facebook, contou que o professor avisou que ia “contar uma piada que talvez ofendesse algumas pessoas”. Quando ninguém se manifestou contrariamente, ele proferiu a frase considerada machista. “Esse professor é piadista mesmo, mas nesse caso perpetua o machismo e insinua um crime. Na hora, ninguém falou nada, até porque não quiseram brigar com professor”, contou o estudante.
A postagem nas redes sociais causou repercussões imediatas. Na tarde da própria quarta-feira (22), um grupo de alunas se reuniu com a vice-diretora do curso de Direito, Clarice Betriz Sohngen, a partir de iniciativa da ex-aluna Christine Rondon. “Meu pedido formal foi pela abertura de uma sindicância, tendo em vista que reuni relatos de várias meninas, inclusive diplomadas, que demonstraram já ter havido tentativa de diálogo, mas sem efeito, havendo reiteradas ‘piadas’ incitando violência contra mulher: ‘moeda na mão, calcinha no chão’, ‘essa é a prostituta das provas: não merece respeito’, ‘mulheres e leis foram feitas para serem violadas’, etc”, relatou Christine.
A professora teria dito, segundo os relatos, que existem complicações para a abertura de sindicância na universidade, mas propôs que sejam realizados debates sobre opressões e minorias, de acordo com Paula Volkart, que representou o Diretório Central dos Estudantes (DCE) na reunião. “Ela disse que devemos lidar com isso de maneira didática, pedagógica”, contou a aluna de Ciências Sociais, que garantiu ter sido muito bem recebida pela vice-diretora.
O próprio DCE também pretende propor formações sobre diversidade sexual e gênero para os professores, de acordo com ela. A sugestão foi dada por Christine à professora, para que seja construído “um espaço de debate entre alunos e professores em torno da temática que aborde os percursos do reconhecimento dos direitos das mulheres”, além de que seja publicada orientação clara a professores para não promoverem banalização da violência contra a mulher em sala de aula. A ex-estudante, atualmente advogada, também contou que Clarice se mostrou muito surpresa e “não relativizou a gravidade das palavras ditas pelo colega”.
A professora Clarice teria se comprometido, segundo as estudantes, a manter o diálogo e dar respostas sobre o ocorrido. Ela foi procurada pelo Sul21, mas até o fechamento da reportagem não havia sido localizada. Da mesma forma, o professor Azambuja foi procurado, mas a PUCRS informou que ele não iria se manifestar.
A Universidade se posicionou através da seguinte nota: “Representantes da Faculdade de Direito ouviram as partes envolvidas no fato relatado durante os dias de ontem e hoje. Estão sendo tomadas todas as medidas cabíveis para solucionar o caso. A PUCRS e a Faculdade de Direito não compactuam com qualquer manifestação ofensiva”. Nas redes sociais, diversos estudantes se posicionaram defendendo o professor, apontando se tratar apenas de uma piada e pedindo que ele não fosse “escrachado”.
Além da reunião com a vice-diretora e dos relatos no Facebook, estudantes e ex-alunos também elaboraram uma carta, encaminhada à coordenação do curso. “Entendemos, como acadêmicos de Direito, que para além dos inaceitáveis casos de assédio ocorridos no interior da faculdade, a violência também se perpetua de forma discursiva, especialmente se a mesma – como ocorre no presente caso – é proferida por indivíduos imbuídos de autoridade, o que entabula a naturalização e a neutralização de violações diversas, em um ambiente, por gênese, inteiramente avesso a manifestações de intolerância como as aludidas”, defende o documento, assinado por mais de 400 pessoas.
Os universitários solicitam, por meio da carta, que a Faculdade se comprometa a orientar os professores para que eles não estimulem, relativizem ou banalizem “comportamentos preconceituosos, discriminatórios, ou que instiguem qualquer forma de aversão à diversidade e à equidade entre os seres humanos”. O Coletivo de Mulheres da PUCRS também elaborou cartazes, que foram colocados no Centro Acadêmico da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, em protesto contra o ocorrido.
Por: Débora Fogliatto, Sul 21