Carta da Economia Solidária à População Brasileira

Carta da Economia Solidária à População Brasileira diante da crítica conjuntura político-econômica e das Eleições de Outubro

1. Nos dias 3 e 4 de agosto de 2022, o Movimento da Economia Solidária Brasileira
realizou a VI Plenária Nacional, organizada pelo Fórum Brasileiro (FBES) e por uma
Comissão Nacional de Organização, que conta com entidades/organizações
parceiras. Essa etapa da VI Plenária, realizada de forma virtual, marca a retomada da
mobilização da Economia Solidária com a realização de plenárias locais, regionais e
estaduais em 26 unidades da Federação, nas quais participaram mais de 3 mil
pessoas. A Plenária será concluída, desta vez de forma presencial, em Brasília, no
próximo mês de novembro.
2. A grave crise econômica e financeira que assola a maioria pobre do país está
colocando milhões de trabalhadoras e trabalhadores no limite de suas vidas. Além
das mortes por COVID-19, que já somam mais de 680 mil, provocadas pela atitude
criminosa e corrupta do Governo Federal em curso, sua política econômica colocou
50 milhões de pessoas em situação de fome e insegurança alimentar.
3. A atual política reduz salários, desqualifica e precariza o trabalho, os direitos e a
previdência; fecha indústrias e suas cadeias produtivas; sucateia e desvaloriza os
serviços públicos; desmonta políticas públicas –inclusive, a da Economia Solidária–;
privatiza empresas públicas, destrói nossas riquezas naturais e submete o conjunto da
nação brasileira aos interesses do capital financeiro e das multinacionais com a
entrega de nossas riquezas nacionais como a água, as florestas e biomas, minérios,
petróleo, entre outros. Vemos uma profunda destruição socioambiental com
devastações provocadas pela indústria madeireira, a do agronegócio e a mineradora –
Amazônia, Pantanal, Brumadinho e Mariana– acompanhadas de assassinatos e
ocupações de terras indígenas.

4. Sob o efeito da pandemia, aliado ao descontrole da política nacional, as
desigualdades sociais e ambientais foram acentuadas e as violações de direitos
humanos multiplicaram-se. Dentre os maiores impactados encontram-se os grupos
mais vulneráveis, tais como a população mais pobre, os negros e negras, nossos
povos indígenas, as mulheres, as pessoas idosas ou com deficiência. Grandes
impactos surgiram na economia do país e especialmente na geração de trabalho e
renda. A população registrou uma perda ou uma forte diminuição da sua renda, assim
como das oportunidades de trabalho. Ocorreu um aumento da fome e o agravamento
da insegurança alimentar das famílias, com impacto maior nas famílias das periferias
das cidades e das famílias do campo.
5. O modelo de desenvolvimento econômico vigente no país e no mundo, do
capitalismo neoliberal, ainda permanece ativo e busca na crise formas de se
reinventar. Preocupado em recuperar suas margens de lucro, tem se aproximado de
formas de autoritarismos governamentais, como já fez em outras épocas, criando um
totalitarismo neoliberal. No contexto da pandemia, vários setores aumentaram seus
lucros, como os setores financeiro, farmacêutico, da saúde, informática, entre outros.
No Brasil e na América Latina, aumentou o número de bilionários, assim como a
fortuna dos já existentes.
6. Não bastassem as consequências nefastas da pandemia, vivemos hoje um Brasil
atacado e ao mesmo tempo abandonado pelo atual presidente; um país que, outra
vez, figura nos índices internacionais da fome; que despreza e abandona a educação;
um Brasil do desemprego, do estímulo à violência, do machismo, da homofobia, do
preconceito religioso; um país autoritário e que desestimula e ataca a democracia; um
Brasil da corrupção e das fake news. Mas, definitivamente, esse não é o Brasil que
merecemos e com o qual sonhamos
7. Diante da crítica conjuntura político-econômica que assola o país –e que precariza
mais e mais a vida de nossa população–, e mesmo considerando as dificuldades que
tal contexto nos impõe, o Movimento da Economia Solidária Brasileira se posiciona
pela urgente retirada de Bolsonaro da presidência. Para isso, é fundamental eleger o
presidente Lula, possibilitando reconquistar os espaços democráticos e os direitos sociais. Fundamental também é eleger um Congresso Nacional (deputadas/os e
senadoras/es) progressista e Governos Estaduais comprometidos com uma agenda
democrática e que acreditem na Economia Solidária como uma forma possível,
equilibrada e viável de organizar o trabalho; uma forma coletiva, associada e
radicalmente democrática.
8. Nós, mulheres e homens fazedores dessa outra economia, uma economia
transformadora que nos acostumamos a chamar de Economia Solidária, não nos
contentamos com esse Brasil e com as precárias condições de vida impostas,
especialmente, pela irresponsabilidade e cinismo atual Governo Federal. Nós, que
somos tão diversas e diversos. Nós, do FBES; nós, dos Fóruns estaduais, regionais e
municipais; nós, das Entidades de Apoio e Fomento; nós, da Rede de Gestores de
Políticas Públicas de Economia Solidária; nós, das Entidades de Representação dos
Empreendimentos Econômicos Solidários; nós, mulheres e homens Quilombolas e
Indígenas; nós, mulheres feministas; nós, promotores de moedas sociais, da
agricultura agroecológica e das feiras orgânicas, dos grupos de consumo responsável;
nós, da agricultura familiar; nós, artesãs e artesãos; nós, catadoras e catadores de
materiais recicláveis; nós, periféricas e periféricos; nós, acadêmicas e acadêmicos
vinculadas/os e apoiadoras/es do Movimento; nós, dos movimentos estudantis; nós,
população LGBTQIA+; nós, das pastorais sociais, entidades nacionais e grupos
ecumênicos identificados com a Economia de Francisco e Clara, proposta pelo Papa
Francisco; nós, todas e todos trabalhadoras e trabalhadores que vemos no trabalho
coletivo-associado uma forma genuína, solidária e revolucionária de [re]organizar o
trabalho; nós não vamos nos calar diante de um Brasil em ruínas.
9. Confiamos na autogestão e por isso a praticamos e lutamos por ela todos os dias.
Autogestão que produz justiça econômica, que educa, que garante a propriedade
coletiva e a gestão democrática dos empreendimentos econômicos solidários,
desfazendo assim a estrutura opressora na qual “o patrão manda e o funcionário
obedece”; autogestão que garante o exercício da democracia radical (direta,
participativa, inclusiva) contra a desigualdade de participação política que é produto
da democracia representativa e seu caráter elitista e excludente.

10. Nós, do Movimento da Economia Solidária Brasileira não nos calaremos e sabemos
que não andamos sós. Não andamos sós porque, como dizia o professor Paul Singer,
a Economia Solidária há de ser o movimento dos movimentos porque se o trabalho
explorador atravessa a vida de todas as pessoas, o trabalho coletivo-associado
também haverá de atravessar. Não andamos sós porque andamos com o Movimento
dos Trabalhadores Ruais Sem-Terra (MST), com a Articulação Nacional de
Agroecologia (ANA), com a Articulação pelo Semiárido Brasileiro (ASA), com a
Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), com os movimentos negros e
Quilombolas, com os movimentos de mulheres, com os movimentos LGBTQIA+,
com os movimentos de juventudes, com o povo da Segurança e Soberania Alimentar,
com o Movimentos dos Pequenos Agricultores (MPA), com o Movimento dos
Trabalhadores Desempregados (MTD), com o povo da Assistência Social e com
tantos outros movimentos sociais e entidades comprometidas com a transformação e
com a justiça socioeconômica no Brasil.
11. Para que a Economia Solidária possa avançar na produção de alimentação saudável,
na inclusão socioeconômica do povo promovendo uma sociedade mais justa,
solidária é necessário que o Estado Brasileiro seja verdadeiramente Democrático e
Solidário, reconheça e fomente nossas formas econômicas coletivas.

Por tudo isso, reivindicamos:

12. A aprovação do marco legal da Economia Solidária de acordo com as demandas do
Movimento.
13. A criação do Fundo Nacional da Economia Solidária, a reativação do Conselho
Nacional de Economia Solidária (CNES); a criação do Ministério da Economia
Solidária; e, a criação do Sistema Nacional de Economia Solidária envolvendo
estados, municípios e organizações da sociedade civil.
14. Que a formulação e implementação da Política Nacional de Economia Solidária seja
planejada e que considere as demandas do Movimento, assim como reconheça as
diferenças culturais e territoriais brasileiras. Neste sentido, especificamente,
reivindicamos políticas que garantam: acesso à terra, águas, florestas para as
comunidades e aos meios de produção para a organização autônoma e autogestionária das trabalhadoras e trabalhadores; a proteção de terras dos povos
indígenas e dos quilombolas; políticas de apoio à comercialização por meio da
disponibilidade de espaços para organização de feiras de comercialização solidária;
compras governamentais e promoção do consumo responsável; políticas de educação
e políticas culturais para a solidariedade e a autogestão priorizando conhecimento
crítico, a diversidade cultural, a troca de saberes e a criação e disseminação da
tecnociência solidária; assim como uma economia com justiça tributária e proteção e
seguridade social universal.
VI Plenária Nacional de Economia Solidária
Fórum Brasileiro de Economia Solidária – FBES
16 de agosto de 2022

 

Um comentário sobre “Carta da Economia Solidária à População Brasileira

  1. Pingback: Revista Casa Comum – Economias transformadoras: outras formas de produzir e acessar bens

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

6 + 1 =