CDES/RS — Uma agenda estratégica para o desenvolvimento (Parte I)

CDESPor Mauri Cruz——

Na última semana o CDES/RS realizou um excelente seminário de discussão sobre a II Carta de Concertação a ser apresentada ao Governador Tarso Genro no final deste ano de 2013. A qualidade do debate decorre de duas questões chaves que tem sido a tônica do processo de concertação existente no Conselhão desde sua instalação em 2011. A primeira é o sentimento de compromisso com a coletividade gaúcha que mobiliza estas mais de 90 mulheres e homens que semanalmente se reúnem voluntariamente para discutir saídas para os problemas do povo gaúcho. A segunda questão chave é a consciência de que é preciso que o estado do Rio Grande do Sul elabore estratégias de desenvolvimento que sejam includentes de todos os segmentos de nossa sociedade e que sejam duradouras.

Uma verdade quase que inquestionável que circula as reuniões e espaços de participação dos conselheiros e conselheiras é de que as políticas públicas do estado gaúcho não tem continuidade. As boas e as ruins. Começam e terminam no espaço de quatro anos. Qualquer política pública para ser implementada e, principalmente, para produzir resultados concretos, precisa de tempo de planejamento, captação e organização de recursos financeiros, seleção e contratação de profissionais, treinamento destes profissionais, aquisição de bens e equipamentos, informação e diálogo com os usuários e, claro, aprimoramento com o tempo para que se torne efetiva e eficaz. Isso tudo exige tempo.

E a descontinuidade na gestão pública do estado gaúcho que se repete nos últimos 30 anos tem sido um fator determinante para a ineficácia das políticas públicas. Para que não pareça retórica, caro leitor, acompanhe comigo e recorde mentalmente o que caracterizou cada um dos mandatos dos governantes dos últimos 30 anos, iniciando com Jair Soares (1983-1986), Pedro Simon (1987-1990), Alceu Colares (1991-1994), Antônio Britto (1995-1998), Olívio Dutra (1999-2002), Germano Rigotto (2002), Yeda Crusius (2006), Tarso Genro(2011-2014). Independente de concordarmos ideologicamente com este ou aquele governo, termos mais simpatias pessoais por este ou aquele governador ou governadora, o certo é que nenhum repetiu ou deu sequência a uma estratégia de desenvolvimento que já estivesse em andamento.

Assumida como verdadeira a causa, ou uma das causas de nosso estágio de carência de desenvolvimento econômico e social contínuo e duradouro, passamos a discutir o que fazer. E foi neste sentido que o referido Seminário do CDES/RS foi importante. Onde há dezenas de prioridades, nada é prioritário. Os Conselheiros e Conselheiras ousaram discutir prioridades organizadas no entorno de quatro dimensões de nosso desenvolvimento, quais seja, as dimensões ambiental, social, econômica e política. Para cada uma destas dimensões foi produzido um breve diagnóstico denominado de contexto, tentando evitar o julgamento de valor sobre as principais constatações ou mesmo de se buscar culpados. A diretriz que orientou este diagnóstico sintético e resumido foi que cada elemento do contexto pode ser, ao mesmo tempo, um risco e uma oportunidade. Visto assim, não houve grandes divergências sobre temas complexos da nossa economia ou da dimensão ambiental, por exemplo.

Passo seguinte, a tarefa foi mais difícil. Como propor medidas estratégicas capazes de se tornarem, primeiro, consenso dentro de um Conselho tão plural e diverso. E, segundo, ser capaz de se tornar uma política de estado perdurando para além do governo atual. Não nos furtamos a tarefa e passamos a discutir a analisar cada proposta. Primeiro buscamos na I Carta de Concertação os temas que entendíamos necessários de serem atualizados. Depois, fomos beber na construção coletiva das produções das Câmaras Temáticas e nas recomendações já encaminhadas ao Governador. Nos assessoramos de secretários e técnicos do quadro de carreira e buscamos inclusive apoio na experiência do Conselhão Nacional.

O produto está aí. São 24 medidas estratégicas que articuladas entre si tem a capacidade de se tornar uma Agenda Estratégica para o Desenvolvimento do RS. Confesso que não é uma iniciativa inédita. Outros grupos já tentaram. Há a Agenda 2020, ouve a tentativa da Assembleia Legislativa em produzir um rol de propostas com base num debate regional. Há as agendas dos movimentos sociais e as agendas das centrais sindicais. Todas iniciativas legítimas e elogiáveis.

Mas talvez o que carecia nestas outras tentativas era a possibilidade real de um processo democrático e cumulativo de concertação entre setores que, no dia-a-dia se enxergam um adversário político do projeto do outro. Aqui creio que temos que aprender que, mesmo nas guerras, quando um exército quer eliminar o outro, há acordo. Há dias de tréguas para recolher os feridos. Há troca de prisioneiros. Há acordo de paz.

O povo gaúcho precisa e merece poder viver um tempo de paz e de construção coletiva de um novo futuro. Uma primeira semente está lançada. O que estamos propondo não é uma agenda para o governo. É uma agenda para a sociedade gaúcha. Será que estamos maduros para entendermos que não há saída duradoura quando apenas um lado ganha?

Mauri Cruz é advogado socioambiental, especialistas em direitos humanos, dirigente nacional da ABONG – Associação Brasileira de ONGS e membro do Comitê de Apoio Local ao FSM.

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